Pressa médica

Reclamam-me muitos leitores que comparecem a consultas médicas, pelo SUS ou por convênios, de que os médicos não os examinam, nem os tocam.

Sei disso mais do que o Eclesiastes. Recentemente, por esse vezo de os médicos não examinarem seus clientes, decretaram falência e fecharam suas portas várias fábricas de estetoscópios.

Antigamente, todo médico que se avistava trazia o estetoscópio pendurado no pescoço.

Sabem por que grande parte dos médicos não examina mais os pacientes, nem os toca? Porque os médicos de hoje só sabem solicitar exames de seus clientes.

Os laboratórios de análises clínicas e as clínicas radiológicas nunca ganharam tanto dinheiro como hoje: claro, os médicos na sua maioria só sabem pedir exames.

Um hábito médico antigo era observado em todas as consultas, hoje tornou-se raro: o médico portava o seu estetoscópio e escutava com ele as costas do paciente, perscrutando os pulmões.

Depois de perscrutá-los, dizia ao paciente: “Diga trinta e três”. Acabou: hoje não mandam mais dizer nem onze, quanto mais trinta e três.

Há alguns médicos que desprezam tanto examinar os pacientes, que já não colocam cadeiras para seus pacientes sentarem nos consultórios, os pacientes são atendidos de pé.

E as macas que se viam em todos os consultórios já não se as veem mais.

Tudo em nome da rapidez. Há médicos que recebem mais de 50 pacientes numa tarde. É tudo no vapt-vupt.

O diabo é que muitos convênios pagam muito pouco por consulta ao médico e este precisa faturar. Então é na base do vapt-vupt!

Vai daí que, pelas mesmas razões, muitos médicos nem olham os resultados dos exames perante os clientes. Comentam os resultados pelo telefone.

Vocês, meus leitores e leitoras, já pararam para analisar que vivemos o tempo da pressa? E a medicina foi atingida infaustamente pela pressa.

Claro que existem reações a esse sistema de pressa entre os próprios médicos.

O gastroenterologista Luiz Edmundo Mazzoleni, por exemplo, marca todas as suas consultas com duração de uma hora e meia cada. Antes de 90 minutos de duração da consulta, ele não dispensa o cliente. Nem de apalpá-lo nem de conversar com ele. E por isso só marca quatro consultas por dia.

Extraordinário exemplo.

Não quero condenar esses médicos que não examinam seus clientes. Sei que a medicina ficou de um jeito, que determinados médicos, se não empunharem três ou quatro empregos, não têm como se sustentar.

O defeito está em que os empregos de médicos pagam muito mal a eles. O sindicato dos médicos tem lutado muito contra essa grave distorção.

Paulo Sant’Ana (Publicada no Jornal Zero Hora)

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