EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Teatro: O Incrível Dr. Green

A ação acontece em uma clínica de estética de um renomado cirurgião plástico, que nunca aparece, mas poderia muito bem acontecer no âmbito de um supermercado onde personagens transitam por gôndolas atrás de um novo produto ou procedimento para esculpir o corpo. São mulheres carentes, inseguras, ansiosas, dispostas a tudo para entrar no seleto grupo das magras com silhueta de modelo de passarela ou capas de revistas. A maior sacada desse texto despretensioso de Gisela Marques, que flui espontâneo na montagem assinada por Ricardo Severo, é flagrar o mundo enfermo da ditadura da beleza pelo viés do humor leve e da mensagem direta. O subtítulo irônico, As Botocudas – uma tragicomédia cirúrgica, dá a medida exata da intenção da peça. Não há a tentação de se fazer uma radiografia profunda de um dos mais discutidos temas da atualidade – a explosão de centros estéticos, a busca insana pelo padrão ideal da perfeição e a crueldade da aparência física como régua de avaliação pessoal. Nessa chave de tom farsesco, a autora se limita a desfiar uma história simples povoada por tipos um tanto bizarros capazes dos piores sacrifícios físicos, alimentares e financeiros para conquistar as tão almejadas curvas perfeitas. 

As clientes que costumam circular pela sala de espera da Clínica Afrodite-se fornecem as pistas necessárias para se entender alguns dos valores cultuados nos dias de hoje. Há uma jovem publicitária workaholic que, embora visivelmente magra após a primeira gravidez, insiste em perder gordurinhas localizadas. Uma garota feia e tímida, por insistência da mãe, quer mudar a silhueta rechonchuda para se dar bem na vida. Uma atriz, modelo e cantora madura busca interromper o processo de envelhecimento. Uma ex-gorda agora se empenha em comercializar sementes que prometem milagres estéticos. Até a funcionária do local, que serve café e conduz as pacientes para o invisível doutor Green, engrossa a galeria das que movem mundos e fundos para ganharem novas estampas.       

São personagens desenhadas com traços caricaturais exatamente para envolver a platéia sem maiores dificuldades. Irreconhecível sob a máscara da adolescente de baixa auto-estima, e solar após submeter-se a cirurgias reparadoras, Amanda Acosta brilha pela versatilidade. Nany People, na pele da ex-gorducha hoje vendedora de kits de dieta, encorpa a sua participação valendo-se de atitudes descomedidas. Com tiques e trejeitos engraçados, Nyrce Levin encarna a apresentadora de tevê que um dia conheceu a fama, cuja obsessão por não envelhecer camufla sua atual fragilidade emocional. Gabriela Alves convence como a publicitária sempre ocupada, mas que acha tempo para tentar eliminar sua barriguinha pós-parto. Mesmo sem falas, Ana Andreatta faz o público rir com a sua copeira que, por conta do consumo exagerado das sementes mágicas, desfila pelo palco em movimentos antinaturais. Único personagem masculino, e muito à vontade, Roberto Rocha faz o simpático recepcionista da clínica, profundo conhecedor da sensibilidade feminina e puxa-saco do chefe o suficiente para não perder um único programa de televisão por ele estrelado.              

Na concepção da direção, a comédia abre espaço também para números musicais, nos quais cada um apresenta seus dramas pessoais. O elenco mostra afinação, especialmente Amanda Acosta, dona de voz potente e suave. Ricardo Severo mostra habilidade na condução da montagem e responde também pela autoria das belas músicas, cujas letras ajudam a demarcar o estado de espírito dos personagens. Ele usa o recurso brechtiano de intercalar as canções entre as cenas. A opção permite quebrar a quarta parede, fazendo com que os atores se dirijam à platéia para falar de suas vidas. O diretor cercou-se de boa equipe técnica. A cenografia de Laura Carone recria com realismo o ambiente de uma clínica clean e sofisticada. Elena Toscano compôs figurinos inspirados e coerentes às personalidades das figuras no palco. A identificação dessa história pelo público, principalmente o feminino, é imediata. Pela lente da comicidade, a peça mostra que não ser bela e magra nos dias atuais chega a soar como ofensa.

(Vinicio Angelici – O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )

(Foto Gal Oppido)

 

Avaliação: Bom

 

O Incrível Dr. Green

Texto: Gisela Marques                                                                                                   

Direção: Ricardo Severo                                                                                                  

Elenco: Nany People, Amanda Acosta, Gabriela Alves e outros.                                       

Estreou: 17/08/2012                                                                                                                               

Teatro União Cultural (Rua Mário Amaral, 209, Paraíso. Fone: 2148-2904). Sexta, 21h30; sábado, 21h; domingo, 19h30. Ingressos: R$ 30 e 40. Até 18 de novembro.

 

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