EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Teatro: Crazy For You

Releitura de Girl Crazy, famoso espetáculo de 1930, esta comédia musical estreou na Broadway em 1992 e pendurou no currículo diversos prêmios por conta de uma engenhosa mistura de ingredientes. As belíssimas canções, assinadas pelos irmãos George e Ira Gershwin, como I Got Rhythm, Someone to Watch Over Me, They Can’t Take that Away from Me e Embraceable You, se tornaram clássicos do cancioneiro americano. As coreografias, apoiadas em sofisticados números de sapateado, conquistaram as plateias. E as equivocadas identidades e as reviravoltas cômicas, fermentos do texto de Ken Ludwig encantaram o tipo de espectador que busca um espetáculo convencional bem realizado. Reverente à matriz, embora livre para brincar com certas sutilezas brasileiras, a adaptação de Miguel Falabella se desincumbiu a contento da difícil tarefa de traduzir as letras das músicas.  

A ingênua trama desenvolve a trajetória de Bobby Child (Jarbas Homem de Mello), um jovem banqueiro de Nova York que, apesar da insistência da mãe, não tem o menor interesse pelos negócios da família e sonha apenas em cantar e dançar no show business. No entanto, à sua revelia, é enviado à pequena e pobre cidade de Pedra Morta, no oeste americano, para cobrar uma dívida bancária e fechar o teatro local. O que não esperava, em sua chegada, era se apaixonar pela atrevida caipira Polly (Cláudia Raia), filha do proprietário do lugar a ser lacrado. Diante do dilema instalado, ele decide permanecer, mas disfarçado de um famoso produtor musical novaiorquino disposto a salvar o velho teatro. Divertida, a estratégia adotada irá tumultuar o enredo de confusões, mal-entendidos e complicações.

O diretor José Possi Neto imprimiu uma encenação leve, borbulhante e fácil de acompanhar. Ele conduz com elegância um elenco de 26 atores, bailarinos e sapateadores que, afinado, executa a espetacular coreografia original da Broadway, de Susan Stroman – ela chegou a enviar para o Brasil a assistente Angelique Ilo, responsável pela direção coreográfica, que contou ainda com a supervisão do americano Jeff Whiting e o auxílio da coreógrafa residente, a sapateadora Chris Matallo. Por sinal, como o sapateado é uma das principais atrações do musical, houve o cuidado até de equiparem os protagonistas e os dançarinos com microfones específicos colados nas pernas para a captação do som de seus pés.

Depois do sucesso de Cabaret, Cláudia Raia e Jarbas Homem de Mello ratificam a harmoniosa parceria artística. O par desata no palco fluente química romântica e cômica. Carismática em cena, a atriz convence como a esquisitona Polly, provando estar em pleno domínio da forma física. Além de encarar com desenvoltura os difíceis números de sapateado, ela dá conta também das nada fáceis partituras do musical, que foram escritas para voz soprano e tiveram de ser adaptadas para o seu timbre de contralto. O ator se firma como um dos grandes intérpretes masculinos desse gênero de espetáculo no Brasil, desembrulhando toda a sua versatilidade como dançarino, cantor e comediante.

Marcos Tumura registra um impagável Bela Zangler, o real produtor musical de Nova York. Em primorosa sequência, uma das melhores da montagem, o seu personagem contracena com um sósia (Homem de Mello, na pele do falso empresário) durante a execução do número O Que Fazer? A cena é apelativamente hilária porque ambos, bêbados e cambaleantes, estão vestidos de forma idêntica e seus movimentos são espelhados. Hellen de Castro interpreta uma noiva desprezada, a dondoca Irene Roth, e incorpora brilho próprio durante a coreografia Garota Malvada na qual, trajando um esfuziante vestido vermelho, declina seus dotes de cantora e dançarina. Está bem coadjuvada pela presença forte de Rodrigo Negrini (Lank, o ambicioso dono do hotel). Com larga experiência no teatro musical, Liane Maya e Jonathas Joba se destacam sem esforço aparente, respectivamente, nos papéis de mãe de Bobby e pai de Polly. Carla Vazquez, na pele de uma atrapalhada dançarina, mostra verniz para a comédia.

Em atuação vigorosa, de impacto cênico, o coro está plenamente entrosado com a proposta. Na canção Tocando o Contrabaixo, os rapazes abraçam as moças pelas costas, dedilhando as cordas presas a elas, como se o corpo fosse um instrumento de contrabaixo. Duda Arruk desenhou cenários fantásticos, inspirados no universo country. Conhecido por sua habitual competência, Fábio Namatame criou 130 figurinos que também aludem à estética do Velho Oeste – em um único vestido de Cláudia Raia, por exemplo, foram empregados cinco camadas de musseline e dez mil cristais. Já a iluminação de Wagner Freire é cheia de matizes, contrastando a escura Nova York com a ensolarada Pedra Morta. Com direção musical de Marconi Araújo, e regida no palco pela maestrina Beatriz De Luca, a orquestra de catorze músicos opera luminosamente a trilha sonora.

O musical é considerado um divisor de águas na história da Broadway. Até sua estréia na década de 1990, o gênero era assolado nos palcos americanos por produções desembarcadas da cena inglesa, caracterizadas por grandiloqüentes efeitos especiais, como O Fantasma da Ópera, Cats, Miss Saigon e Evita. Quando este crítico viu a montagem em Nova York, em 1994, jamais imaginou vê-la encenada no Brasil, tamanha a complexidade da coreografia e a precisão dos números de sapateado. Mas o País evoluiu nessa área e grandes espetáculos musicais têm sido montados com êxito no teatro nacional. A versão brasileira deste funciona porque reuniu um grupo que dança, canta, atua e sapateia com a mesma qualidade das congêneres americanas e inglesas.

(Vinicio Angelici – O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )

(Foto Ali Karakas)

 

Avaliação: Ótimo

 

Crazy For You

Texto: Ken Ludwig

Músicas: George e Ira Gershwin

Adaptação: Miguel Falabella

Direção: José Possi Neto

Estreou: 29/11/2013

Teatro Sérgio Cardoso (Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista. Fone: 3288-0136). Quinta e sexta, 21h; sábado, 17h e 21h; domingo, 18h. Ingresso: R$ 50 e R$ 60. Até 21 de setembro.

 

Veja cenas do musical:

 

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