Teatro: Um Dia Ouvi a Lua
- Criado em Quinta, 21 Julho 2011 12:48
- Escrito por Vinício Angelici
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Três clássicos do cancioneiro popular brasileiro, gravados pela célebre dupla Tonico e Tinoco, dão corpo e alma a este espetáculo sensível e emocionante, assinado pela intrépida Cia. Teatro da Cidade, de São José dos Campos. A novidade é que na versão do dramaturgo Luís Alberto de Abreu, as canções Adeus, Morena, Adeus, Cabocla Tereza e Rio Pequeno, que narram histórias de paixão, abandono e crime sob o ângulo masculino, ganharam o foco feminino. Além de conceder voz a quem não tinha, valorizando o olhar da mulher como contraponto ao olhar do homem, a proposta subverte a tradicional narrativa que começa e se desenvolve a partir de uma visão machista. É um achado que o espetáculo, dirigido por Eduardo Moreira, do Grupo Galpão, que contou com o auxílio nessa tarefa de Cláudio Mendel, trata de realçar. O trabalho, aliás, é uma bem-sucedida parceria entre dramaturgia, direção e elenco, o que se convencionou chamar de teatro colaborativo e que normalmente funciona quando há um bom dramaturgo na retaguarda. São José dos Campos é a cidade onde se ambientam as tramas, que não transcorrem de forma linear, mas se entrelaçam e se valem da linguagem da memória. Nesta delicada montagem, as canções são interpretadas ao vivo pelos atores, que ora narram ora representam as histórias. Vander Palma e Wallace Puosso desempenham os papéis masculinos com muita garra. Uma vez que a encenação realça o feminino, as atrizes se sobressaem. Adriana Barja e Andréia Barros, com sobras de talento, encarnam as duas fases de Beatriz, jovem e madura, figura central da canção Adeus, Morena, Adeus, sobre uma menina que se apaixonou por um violeiro e foi abandonada por ele na estação de trem. Hoje, mulher feita, retorna ao mesmo local na esperança de reencontrá-lo. Tereza, de Cabocla Tereza, ganha robustez nos ótimos desempenhos de Ana Cristina Freitas e Adriana Barja. Aqui, a personagem-título foi morta pelo marido e retorna para contar as razões que a levaram a abandonar o casamento. Memorável no papel de Sá Mariazinha, de Rio Pequeno, a atriz Izildinha Costa impõe-se como a jovem que sai da casa dos pais para vivenciar um grande romance em Mato Grosso. Além destas canções que desencadeiam os enredos, a trilha sonora é complementada pelas incidentais Folia de Reis e Folia do Limoeiro.
O mais interessante na dramaturgia lírica de Abreu, que bebe na fonte do teatro nô japonês ao mesclar poesia, dança, música instrumental e canto, é a maneira como ele trabalha com ritos. Não há reviravoltas nas histórias, todos os personagens cumprem o mesmo itinerário até o fim. Ninguém escapa de seu destino já antevisto no início de cada trama. Tudo embalado por imagens lúdicas, como as brincadeiras de criança ou pela presença de personagens infantis. O elenco, que canta a capela e até a três vozes, se apóia em uma equipe técnica de gabarito. Assinado por Leopoldo Pacheco e Ana Maria Bonfim Pitiu, o cenário é composto por folhas secas de palmeiras, bambus, malas antigas e corda, elementos que remetem ao universo caipira. Os figurinos, da mesma dupla, atendem à proposta de evocar o popular sem reinterpretá-lo. A iluminação de Cláudio Mendel contribui para criar o clima onírico do espetáculo. As canções, verdadeiras pérolas do cancioneiro de raiz, ganharam belos arranjos do maestro Ernani Malleta e Beto Quadros, este também responsável pela direção musical. Trata-se de uma das mais belas e envolventes montagens em cartaz na cidade. É capaz tanto de produzir identificação fácil por expor a riqueza da cultura popular como atrair pela delicadeza com que as histórias são desembrulhadas. A prosa poética de Abreu é exercício sublime e encantador.
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)
(Foto Divulgação)
Avaliação: Ótimo
Um Dia Ouvi a Lua
Texto: Luis Alberto de Abreu
Direção: Eduardo Moreira
Elenco: Cia. Teatro da Cidade
Estreou: 10/06/2011
Teatro João Caetano (Rua Borges Lagoa, 650, Vila Mariana. Fone: 5559-1744) Sexta e sábado, 21h; domingo, 19h. Ingresso: R$ 10. Até 02 de junho.
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