EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

  • Font size:
  • Decrease
  • Reset
  • Increase

Teatro: Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos

Poucas vezes um título foi tão apropriado. Aqui, as mulheres se movem de um lado para o outro, literalmente desesperadas. Elas são protagonistas nesta comédia cult do atrevido cineasta espanhol Pedro Almodóvar, que migrou das telas de cinema (1988) para os palcos da Broadway (2010), em adaptação de Jeffrey Lane com músicas e letras de David Yazbek. O diretor Miguel Falabella assina a versão brasileira, mais calcada em uma montagem londrina do início desse ano. Esta apresentava novas canções e se concentrava mais particularmente na personagem da mulher abandonada Lúcia, redimensionando a importância dos demais personagens.

A trama segue o formato de um vaudeville, com seus jogos de encontros e desencontros. Pepa (Marisa Orth), uma atriz que trabalha com dublagem e guarda em segredo sua gravidez, é abandonada pelo mulherengo Ivan (Juan Alba). Seu desespero irá acionar a roda de acontecimentos. Sua melhor amiga, Candela (Helga Nemeczyk), se apaixona por um terrorista e receia parar na prisão como cúmplice. Lúcia (Totia Meireles), ex-mulher de Ivan, resolve se vingar dele depois de ter sido preterida. Há ainda a advogada cínica Paulina (Érika Riba) e a noiva inerte Marisa (Carla Vazquez), também com emoções à flor da pele. O resultado desse universo feminino em ebulição é um espetáculo que o tempo todo desliza em ritmo agitado e explora a comicidade natural das situações expostas. Tudo se passa na década de 1980, em uma Madri de sangue quente, pós-ditadura franquista, época em que a sociedade experimentava a boemia e a liberdade sexual.

Curiosamente, o musical não fez sucesso em Londres nem em Nova York. Falabella arrisca uma explicação. Mulheres com esse perfil tresloucado são muito mais comuns na cultura latina. No universo inglês e americano, elas agiriam de maneira mais racional. Será? Ciente de que o humor de Almodóvar guarda proximidade com o espírito irreverente do brasileiro, ele imprimiu acertadamente um tom folhetinesco à montagem. Cenas como a de uma tentativa de suicídio, a da invasão de uma dupla de policiais de armas em punho e a de um gazpacho (típica sopa espanhola) servida com aditivos químicos, são abusadamente divertidas.

A direção obtém bom rendimento do elenco de dezenove atores, especialmente da trupe feminina, cheia de estilo e entusiasmo. Parece que o papel de Pepa foi escrito para Marisa Orth, tamanha é a sua identificação com a personagem. Ela oscila entre a resignação e a raiva, mostra a conhecida afinação na hora de cantar e revela excelente timing para comédia. Na pele da desvairada Lúcia, a atriz Totia Meireles desembrulha performance luminosa e explora sem exageros sua veia cômica, além de carimbar seu grande momento ao interpretar a canção Invisível. Com boa voz, Helga Nemeczyk está hilária como a enlouquecida e desajeitada Candela. Erika Riba (Paulina) entrega desempenho satisfatório e Carla Vazquez tem ótima cena quando sua personagem Marisa é induzida ao orgasmo após provar o gazpacho adulterado.                                                                                                                           

O grupo masculino é encabeçado por Juan Alba, intérprete de Ivan, o objeto amoroso em disputa pelas amantes em estado de guerra.  O ator aparece mais no segundo ato e a adorável canalhice de seu latin lover é convincente. Daniel Torres encarna o filho do homem infiel, com empenho e diligência. Carismático e sexy, Ivan Parente dá vida ao taxista, uma espécie de narrador que observa e interage com os demais – ele é responsável pela esfuziante abertura do espetáculo, quando apresenta os personagens e situa a ação.  

A equipe técnica destila competência. André Cortada assume a direção musical e regência da banda de sete músicos, que executa as músicas pulsantes, um mosaico de diversos ritmos latinos, da bossa nova ao mambo, do flamenco ao bolero. O imponente cenário concebido por J. C. Serroni é uma estrutura com dois círculos giratórios concêntricos na base do palco, que ajuda a movimentar atores e objetos cênicos – um dos destaques é um Lada branco 1986, o táxi que transporta essas mulheres pela capital espanhola.  Ao fundo do palco, um skyline mostra imagens da cidade de Madri.   Merecem registro o videografismo e projeções de Rico e Renato Vilarouca. Fábio Namatame criou 150 figurinos coloridos, inspirados nas combinações usadas nos anos 1980. A equipe de visagismo, pilotada por Dicko Lorenzo, caprichou nos típicos penteados e perucas cafonas. Fernanda Chamma criou coreografias interessantes, que projetam a agitação emocional dessas figuras no palco, e Drika Matheus teceu um elaborado desenho de luz. Trata-se de uma comédia musical que, sem pretensões psicológicas, traduz a histeria, a obsessão e o drama de muitas mulheres envolvidas em relacionamentos turbulentos. A montagem envolve o público com sua salada de ingredientes absurdos e porções de melancolia. No fundo, Pepa, Lúcia, Candela, Paulina e Marisa são criaturas que traduzem alguns dos contemporâneos poderes femininos, como a emancipação e a luta pela auto-preservação.  

(Vinicio Angelici O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )

(Foto Divulgação)

 

Avaliação: Bom

 

Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos

Texto: Jeffrey Lane

Músicas e Letras: David Yazbek

Direção: Miguel Falabella

Elenco: Marisa Orth, Totia Meireles, Helga Nemeczik, Juan Alba e outros.

Estreou: 16/11/2015

Teatro Procópio Ferreira (Rua Augusta, 2823, Cerqueira César. Fone: 3083-4475). Quinta e sexta, 21h; sábado, 17h e 21h; domingo, 16h. Ingressos: R$ 50 a R$ 200.

Comente este artigo!

Modo de visualização:

Style Sitting

Fonts

Layouts

Direction

Template Widths

px  %

px  %