EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Teatro: A Coleção

Escrita pelo dramaturgo inglês Harold Pinter, a história de dois casais, e a confusão decorrente a partir de um mal explicado caso de infidelidade conjugal, navega por leito ambíguo, de diálogos concisos e pausas reveladoras. Na peça, o autor circula pelas várias facetas da verdade e instaura um conflito silencioso entre homens e mulheres, classes sociais e pulsões sexuais. A montagem dirigida por Esther Góes trata de dar evidência aos principais aspectos embutidos nesse texto, leve e tenso ao mesmo tempo, sobre maneiras sutis de explorar e manipular o outro. Ambientada em Londres na década de 1960, a trama tem como pano de fundo o mundo da alta costura. Inquietante, o enredo se desenrola aos poucos, mostrando detalhes dos personagens e seus relacionamentos. Nenhum deles, por sinal, é especialmente atraente ou simpático.James é induzido a acreditar que sua esposa Stella, criadora de coleções, cometeu adultério com o jovem colega e rival de profissão Bill, quando ambos trabalhavam em um desfile de moda em Leeds. Este vive com o parceiro mais velho e rico Harry, espécie de seu protetor. O jogo começa no momento em que o marido supostamente traído telefona anonimamente para o rapaz, passando a assediá-lo. No princípio, Bill nega tudo, depois confirma, aí retira a admissão, deixa a dúvida no ar. Indefinições e incertezas irão permear os encontros entre eles, quase sempre em confrontos duplos.

Tudo acontece num palco dividido entre a elegante casa de Harry e o moderno apartamento de James e Stella, ligados por uma cabine telefônica no centro. Estabelecida a conexão entre os dois casais, a tensão será gradativamente construída. Pinter investiga as personalidades, reações e atitudes. Não apressa os acontecimentos, valoriza os silêncios e produz uma envolvente cumplicidade com o público. O espectador irá observar que se os pares estão financeiramente saudáveis, na vida sexual parece que as coisas saíram do eixo e a relação anda insatisfatória. James ignora sua esposa e prefere dedicar mais atenção para o jornal. Não é diferente na outra residência - Bill também gasta poucas palavras com Harry.  O espetáculo pinça interesse do fato de que todos os personagens trabalham com a mesma história, mas examinada, vista, contada por meio de diversas perspectivas, sem nunca se esclarecer de forma integral. Quem está dizendo a verdade? Uma confusão, no fundo, agradável de se acompanhar. Os embates em torno da suspeição de adultério se mantém sempre no nível de uma casual cordialidade, em vez de socos ou armas, ainda que haja um duelo simulado de facas em determinada sequência. Na obra de Pinter, a comunicação plena entre os seres humanos é impossível, mas muitas vezes as palavras ferem. É devastador o discurso em que Harry se despe da fina camada aristocrática e humilha Bill por conta de sua origem na favela.      

Marcos Suchara empresta autoridade no papel de Harry, esta figura petulante que aceita com desdém as fraquezas do parceiro e revela fragilidades no momento em que surge um rival em potencial. Marcelo Szpektor faz Bill com estilo e a discreta arrogância de quem se tornou um profissional bem-sucedido. James, na performance de Ariel Borghi, ganhou a ambivalência necessária de alguém que pode estar também atraído sexualmente. Stella, feita por Amazyles de Almeida, é sedutora sem ser exagerada. O que importa não é se Stella dormiu ou não com Bill em um quarto de hotel em Leeds. A questão que sobressai é até que ponto a imaginação é útil para lidar com a realidade. Até que ponto, no caso de um casamento, a fantasia serve de combustível temporário para o flerte com o proibido. No fundo, trata-se de uma peça sobre a insegurança sexual. Talvez Stella tenha criado o caso para instigar um marido acomodado. Talvez Bill queira desestabilizar Harry, afirmando a sua importância. Em Pinter, os personagens se comportam de um jeito, mas querem agir exatamente de outro.
(Edgar Olimpio de Souza – O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )                                                           

(Foto: Arnaldo Torres)

 

Avaliação: Bom

 

A Coleção

Texto: Harold Pinter                                                                                                          

Direção: Esther Góes                                                                                                       

Elenco: Ariel Borghi, Amazyles de Almeida, Marcos Suchara e Marcelo Szpektor               

Estreou: 16/03/2012                                                                                                                    

Teatro Grande Otelo (Alameda Nothmann, 233, Campos Elíseos. Fone: 3221-9878). Sexta e sábado, 21h; domingo, 20h. Ingresso: R$ 60. Até 17 de junho.

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